O uso indevido de uma marca não implica
necessariamente dano moral ao seu titular. A ofensa à honra e à
reputação do titular da marca precisa ser demonstrada para dar direito a
esse tipo de indenização. Com essas considerações, a Terceira Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou recurso da Confederação
Brasileira de Futebol (CBF), que pretendia ser indenizada por danos
morais em razão de uso de sua marca em mercadorias de uma microempresa
fabricante de bolsas, bijuterias e acessórios. A relatora do recurso é a
ministra Nancy Andrighi.
Inicialmente, a sentença determinou
que a empresa se abstivesse de comercializar produtos com o emblema da
CBF e condenou-a ao pagamento do valor equivalente a três mil exemplares
do produto apreendido. Para tanto, seguiu o artigo 103, parágrafo
único, da Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98), segundo o qual, não
se conhecendo o número de exemplares que constituem a edição não
autorizada de obra literária, artística ou científica, o transgressor
deverá pagar o valor de três mil exemplares, além dos apreendidos. A
sentença ainda reconheceu a ocorrência de dano moral, e fixou-o no dobro
desse valor.
Ao julgar a apelação da empresa, o Tribunal de
Justiça de São Paulo (TJSP) afastou a indenização por dano moral, por
entender que sua ocorrência não estaria demonstrada. Afirmou que o dano
moral não decorre automaticamente do fato, já que a CBF é “entidade
administradora de desporto, que não se dedica ao mesmo ramo de atividade
explorado pela empresa”.
Quanto ao dano material, o TJSP
entendeu que a aplicação por analogia da Lei de Direitos Autorais, no
caso, não seria cabível, pois a CBF poderia demonstrar quanto deixou de
lucrar por não terem sido pagos
royalties. O TJSP limitou a indenização material ao valor dos bens efetivamente apreendidos, atualizado e acrescido de juros de mora.
Dano materialA
CBF recorreu, então, ao STJ, pedindo o aumento da indenização por dano
material e o restabelecimento da reparação por dano moral. A Terceira
Turma reconheceu a ocorrência do dano material, mas destacou que a
indenização não poderia ficar restrita ao valor dos bens que foram
apreendidos.
Para a relatora, trata-se de violação da marca, direito regulado pela Lei de Propriedade Industrial (
Lei 9.279/96),
que tem critérios específicos para quantificação do dano material
(artigo 210). Assim, o valor será determinado pelo critério mais
favorável à CBF, a ser quantificado em liquidação de sentença:
benefícios que teria auferido se a violação não tivesse ocorrido;
benefícios auferidos pela empresa violadora do direito ou, ainda,
remuneração que a empresa violadora teria pago à CBF pela concessão de
uma licença para explorar o bem.
Dano moralQuanto
ao dano moral, a ministra Nancy Andrighi afirmou que deve ser
comprovado, pois não é presumido. No caso, a CBF tem a finalidade de
organizar e coordenar a prática de atividades ligadas ao futebol. Sua
principal atividade econômica é a produção e promoção de eventos
esportivos e não a venda de produtos com sua marca.
A ministra
lembrou que o dano moral da pessoa jurídica corresponde hoje, em nosso
sistema legal, à lesão a direito de personalidade, e a marca não integra
a personalidade do seu titular. “Ela apenas designa um produto e sua
violação traz diretamente danos materiais. Até poderá haver lesão à
honra subjetiva do titular, mas apenas em algumas hipóteses”, explicou.
A
relatora citou o caso do REsp 1.174.098, em que houve lavratura de
protestos em desfavor da empresa, e o REsp 466.761, em que produtos
voltados para público exclusivo foram vulgarizados com a exposição do
produto falsificado. Tratando-se de produtos de qualidade inferior, com a
insatisfação do consumidor, quem passa a ser malvisto não é o
falsificador, mas a empresa vítima da falsificação.
Usurpação de identidade
No
caso julgado, não se tem informação sobre a qualidade dos produtos
falsificados. Além disso, refletiu a ministra, há a peculiaridade de que
as pessoas que adquirem os produtos licenciados pela CBF “estão muito
mais interessadas em ostentar algo que tenha relação com a seleção
brasileira de futebol do que com a marca CBF propriamente dita”.
Em
seu voto, a ministra também explicou que a falsificação é uma usurpação
de parte da identidade do fabricante. O falsificador cria confusão de
produtos e se faz passar pelo legítimo fabricante de bens que circulam
no mercado.
No caso em análise, entretanto, como a atividade
primordial da CBF não é a comercialização de produtos, o público não
deixa de reconhecê-la ou passa a ter uma imagem negativa a seu respeito
somente porque foram comercializados produtos falsificados com a sua
marca. Por isso, segundo a relatora, era necessária a demonstração
efetiva do dano moral, o que não foi feito pela CBF.