A Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) manteve decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
(TJRJ) que admitiu a nomeação da Defensoria Pública como curadora
especial de incapaz. O recurso contra a decisão foi interposto pelo
Ministério Público (MP). A decisão foi unânime.
O caso envolve
ação de acolhimento institucional movida pelo MP, em defesa de um bebê
de 45 dias que tinha sido dado por sua mãe em troca de R$ 100, para
compra de crack destinado a consumo próprio.
Decisão
interlocutória em primeira instância nomeou a Defensoria Pública como
curadora especial da criança. O MP do Rio de Janeiro recorreu da
decisão, mas o TJRJ manteve o entendimento do juízo, e a discussão
chegou ao STJ em recurso especial.
Para o Ministério Público, a
nomeação da Defensoria como curadora especial seria desnecessária, já
que a criança nem sequer estaria litigando como parte. Destacou ainda
que seus direitos individuais indisponíveis já estariam sendo defendidos
pelo Ministério Público e que a duplicidade de atos, além de desvirtuar
a vocação constitucional da Defensoria, prejudicava os interesses da
criança e a ação do MP.
Cuidado maiorA
ministra Nancy Andrighi, relatora, reconheceu que, já atuando o
Ministério Público no processo, não haveria necessidade da intervenção
obrigatória do defensor público, mas destacou que a peculiaridade da
situação dos autos exigia maior cuidado.
Segundo enfatizou,
quando há conflito entre os interesses do incapaz e os de seus pais ou
representante legal, “a lei impõe a nomeação de curador especial para o
desempenho de uma função tipicamente processual, ou seja, o curador terá
o dever específico de defender os interesses da parte em determinado
processo”.
A ministra também rebateu o argumento do recorrente
no sentido de que a criança acolhida não seria parte no processo e,
assim, não lhe seria possível a nomeação de curador.
“Dada a
possibilidade de tamanha repercussão em sua órbita de direitos (podendo,
inclusive, implicar a alteração de sua filiação e do patronímico
familiar, na hipótese de adoção), não se pode ignorar que o incapaz,
nessas circunstâncias, ainda que formalmente não tenha sido – ou deixe
de ser – relacionado em algum dos polos do processo, é o principal
afetado por uma sentença que eventualmente não o reintegre ao convívio
familiar”, disse ela.
Integração operacionalNancy
Andrighi lembrou ainda que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
estabelece como diretriz geral da política de atendimento dos direitos
da criança e do adolescente a integração operacional de órgãos do
Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Conselho Tutelar e
outros.
Para ela, a participação da Defensoria enriquece o
debate e cria um leque maior de alternativas para o rápido encerramento
do acolhimento.
“Uma visão bifocal da realidade fática em apreço
contribui sobremaneira na busca de uma solução adequada e que atenda ao
princípio do melhor interesse do menor”, disse.
Ademais,
segundo explicou, “estão em jogo dois interesses antagônicos, quais
sejam o direito à convivência familiar e a garantia de proteção contra
toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão, ambos elencados pelo artigo 227 da Constituição
como direitos a serem assegurados pela família, sociedade e estado às
crianças e adolescentes”.
Nesse sentido, destacou que, no que
compete ao estado, este deve cercar-se da mais ampla rede de proteção e
assistência, a fim de assegurar que efetivamente seja dado ao incapaz o
melhor e mais saudável destino. Daí a inclusão, pela
Lei 12.010/09,
do princípio da integração operacional entre Judiciário, Ministério
Público, Defensoria Pública e demais entidades na busca da melhor e mais
rápida solução para a hipótese específica de acolhimento familiar ou
institucional.
Papéis distintosSegundo a
ministra, a Defensoria Pública não tira do Ministério Público a
atividade de zelar pelos interesses indisponíveis da infância e da
juventude, pois exerce apenas função processual de representação do
menor para garantir a defesa de seus interesses.
“Ao MP fica
assegurado o exercício de sua função institucional de defesa judicial
dos direitos das crianças e adolescentes, com a característica de
exercer seu mister de representação não apenas em caráter
endoprocessual, mas sim no interesse de toda a sociedade,” esclareceu.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.