DECISÃO
Quinta Turma muda entendimento sobre natureza do crime de descaminho
A Quinta Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) modificou entendimento sobre a natureza do crime de
descaminho, previsto no artigo 334 do Código Penal. No julgamento de
habeas corpus, o colegiado definiu que o crime possui natureza formal,
não sendo necessária a indicação do valor do imposto que deixou de ser
recolhido para a sua caracterização.
O acusado foi preso em
flagrante com diversos produtos eletrônicos, trazidos do exterior sem
documentação. Após a impetração de dois habeas corpus, sem sucesso, o
juiz de primeira instância concedeu liberdade ao preso, em razão do
excesso de prazo da prisão.
O paciente apresentou então habeas
corpus perante o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), em que
pediu o trancamento da ação penal, alegando ausência de constituição
definitiva do crédito tributário. No STJ os ministros não conheceram da
impetração.
Não material
Segundo a
ministra Laurita Vaz, relatora do habeas corpus, o crime de descaminho
se caracteriza como o ato de iludir o pagamento de imposto devido pela
entrada de mercadoria no país. Para ela, não é necessária a apuração
administrativo-fiscal do montante que deixou de ser recolhido para que o
delito seja configurado. “Trata-se, portanto, de crime formal, e não
material”, afirmou.
A ministra citou precedente da relatoria do
ministro Gilson Dipp (HC 171.490), que considerou que a falta de
indicação do valor de tributos devidos “não macula a inicial
acusatória”, pois o descaminho é delito formal e se concretiza com “a
simples ilusão do pagamento do tributo devido”.
Garantiu ainda
que tal entendimento está em harmonia com o emanado pelo Supremo
Tribunal Federal (STF), conforme voto proferido pelo ministro Ayres
Britto no HC 99.740.
O ministro do STF afirmou que a consumação
do delito de descaminho e a posterior abertura de processo criminal não
dependem da constituição administrativa do débito fiscal. “Primeiro,
porque o delito de descaminho é rigorosamente formal. Segundo, porque a
conduta materializadora desse crime é iludir o estado quanto ao
pagamento do imposto devido. E iludir não significa outra coisa senão
fraudar, burlar, escamotear”, declarou.
Política econômica
Conforme
análise de Laurita Vaz, o dispositivo do Código Penal visa proteger, em
primeiro lugar, a integridade do sistema de controle de entrada e saída
de mercadorias do país, como “importante instrumento de política
econômica”.
Todavia, a ministra explica que o bem jurídico
protegido pela norma é mais do que o mero valor do imposto, englobando a
estabilidade das atividades comerciais dentro do país, com reflexos na
balança comercial entre o Brasil e outros países.
A ministra
refletiu que o produto inserido no mercado, fruto de descaminho, lesa o
erário e constitui comércio ilegal, “concorrendo, de forma desleal, com
os produzidos no país, gerando uma série de prejuízos para a atividade
empresarial brasileira”.
Laurita Vaz lembrou que a Lei 9.430/96,
com redação dada pela Lei 12.350/10, que trata da representação fiscal
para fins penais, não faz referência ao crime de descaminho. “E, mesmo
que fizesse, por se tratar de crime formal, não condicionaria a
instauração de investigação ou de ajuizamento de ação penal para apurar o
crime”.
A relatora afirmou que as esferas administrativa e
penal são independentes, “sendo desinfluente a constituição definitiva
do crédito tributário pela primeira para a incidência da segunda”.
Coordenadoria de Editoria e Imprensa
HC 218961
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22/10/2013 |