A
Corte Europeia de Direitos Humanos validou, nesta sexta-feira (12/7), a
existência de um terceiro veredicto: absolvição teórica. Os juízes
decidiram que um réu que foi condenado, cumpriu sua pena e depois teve
sua condenação anulada diante de novas provas não é, necessariamente,
inocente. Não tem direito de reclamar indenização por danos morais pelo
tempo que ficou preso. A decisão da corte é final.
A presunção de
inocência está prevista no parágrafo 2º do artigo 6º da Convenção
Europeia de Direitos Humanos. Prevê o dispositivo que todo mundo é
presumidamente inocente até que sua culpa seja legalmente provada. No
julgamento desta sexta, a corte mitigou esse princípio ao estabelecer
que, se a condenação é anulada e não é feito novo julgamento, o réu não
pode ser considerado um inocente erroneamente condenado. Não é vítima de
erro judicial. Tecnicamente, ele é um inocente aos olhos da Justiça,
mas que já passou anos atrás das grades e não vai receber nenhuma
compensação por isso.
A história analisada pelos juízes ilustra
bem a situação de quem acaba caindo nesse limbo jurídico. A britânica
Lorraine Allen foi condenada a três anos de prisão pelo assassinato do
seu filho de quatro meses. A condenação foi baseada em laudo médico que
apontou como causa da morte do bebê danos cerebrais comuns em crianças
que são sacudidas com violência. Depois que Lorraine já tinha cumprido a
pena, novo laudo médico colocou em dúvida a causa da morte do bebê. Ela
recorreu à Corte de Apelação e a condenação foi anulada. Como a pena já
tinha sido cumprida, o Ministério Público não pediu novo julgamento.
Tecnicamente,
ao suspender o julgamento que condenou Lorraine, o que a Corte de
Apelação fez foi absolvê-la da acusação. A britânica começou uma nova
batalha na Justiça para receber indenização por danos morais, alegando
que foi vítima de erro judicial. Fracassou em todas as instâncias por
não se encaixar em nenhuma das definições britânicas de erro judicial.
Até
recentemente, depois de ter sua condenação anulada, o réu precisava
provar sua inocência para ser considerado vítima de erro judicial e ter
direito à indenização. Em maio de 2011, a
Suprema Corte do Reino Unido anunciou o que foi considerado pelos
advogados como um dos julgamentos mais importantes da história do país.
O tribunal decidiu que, para receber indenização do governo, não é mais
preciso comprovar inocência. Os julgadores da corte máxima britânica
ampliaram o conceito de erro judicial para abranger também os casos em
que a Corte de Apelação anula a condenação do réu porque surgiram provas
que, se tivessem sido apresentadas no julgamento, o corpo de jurados
não teria decidido pela condenação.
O caso de Lorraine não se
encaixou nesse novo conceito de erro judicial porque a Corte de Apelação
considerou que, com o novo laudo médico, havia uma possibilidade de que
o júri a absolvesse da acusação. Mas, sem essa certeza, não havia como
reconhecer que ela era uma pessoa inocente condenada por erro da
Justiça.
Para a Corte Europeia, tanto a lei como a Justiça
britânica estão de acordo com a Convenção de Direitos Humanos. Os juízes
europeus explicaram que a absolvição de Lorraine aconteceu por motivos
formais. A Corte de Apelação não analisou o mérito, mas apenas a
possibilidade de um eventual veredicto diferente. De acordo com a corte
europeia, caberia ao júri — e só a ele — analisar a inocência ou
culpabilidade de Lorraine. Sem um novo julgamento, ela não tem como ver
sua inocência reconhecida e não tem direito a se declarar vítima de erro
judicial.
Clique aqui para ler a decisão — em inglês.