A
Justiça não pode arcar com as consequências da morosidade do juízo
arbitral. Por isso, não pode proferir decisão que esvazie o conteúdo de
uma discussão que o contrato manda acontecer em uma câmara de
arbitragem. A decisão
é da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça
de São Paulo, que rejeitou Embargos de Declaração em Medida Cautelar que
pretendia garantir o cumprimento de um contrato enquanto a questão não
era discutida em arbitragem.
O caso foi levado à Justiça pela
empresa norte-americana de produtos esportivos Nike. A companhia
reclamava de contrato assinado em 2009 com a SBF Comércio de Produtos
Esportivos. O documento estabelecia que a empresa brasileira instalasse
50 lojas de revenda da Nike no Brasil até dezembro de 2012, mas a
americana afirma que isso não aconteceu.
A alegação da Nike é que o
contrato tem cláusula arbitral para resolver pendências negociais, mas a
câmara arbitral nunca foi instalada. Afirma que solicitou a instalação
da discussão em arbitragem à Câmara de Comércio Brasil-Canadá em
janeiro, que não tomou providências. Por isso, foi à Justiça pedir que o
contrato seja mantido e que as lojas já abertas continuem funcionando
até que a decisão final seja tomada, em arbitragem.
Mas a juíza
Fernanda Gomes Camacho, da 19ª Vara Cível de São Paulo, negou o pedido.
Afirmou que o Judiciário não poderia ser invocado a resolver conflitos
que o contrato, um ato jurídico perfeito, determina que sejam discutidos
em arbitragem. Quem deve discutir a questão é o árbitro indicado pelas
partes, não o Estado-juiz, diz a sentença.
“Nos termos do artigo
8º da Lei 9.307/1996, ‘a cláusula compromissória é autônoma em relação
ao contrato em que estiver inserida, de tal sorte que a nulidade deste
não implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromissória’. E,
nos termos do parágrafo único do artigo 8º da mencionada lei, ‘caberá
ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões
acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e
do contrato que contenha a cláusula compromissória’. Assim, a matéria
quanto à validade e eficácia da convenção de arbitragem deverá ser
submetida ao exame dos árbitros indicados no procedimento arbitral”,
afirma a juíza na decisão. Fernanda Camacho entendeu que o pedido da
Nike tinha o único intuito de antecipar uma definição da questão e
esvaziar a discussão na arbitragem.
A Nike, então, recorreu ao TJ,
mas também não foi atendida. O relator, desembargador Enio Zuliani,
apontou o descabimento do pedido: “A embargante insiste em obter
pronunciamento da Justiça estadual quando, por livre vontade, escolheu a
arbitragem como meio de solução dos conflitos. Agora diz que o juízo
arbitral é moroso”.
Zuliani argumenta, como também fez a sentença,
que se uma câmara arbitral não atendeu ao pedido de instalação do
juízo, caberia às empresas procurar outra câmara arbitral, como a da
Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp). O que não pode ser feito
é, diante da morosidade de uma câmara de arbitragem, ignorar uma
cláusula contratual e pedir que o Judiciário resolva a questão. “O
Judiciário foi excluído completamente e isso deve ter alguma razão,
sendo que não está licenciado, agora, a usurpar a competência definida
no contrato.”
“Os termos são claros e não interessa que o
Regulamento da Câmara de Comércio Brasil- Canadá preveja a possibilidade
de conviver com medidas cautelares da Justiça comum, para se ter como
direito certo o de exigir pronunciamento do juiz de Direito sobre a
cautelar que, em verdade, resolveria o problema da parceria entre as
empresas litigantes. O fato é que a medida cautelar é em tudo e para
tudo o cerne da lide a ser solucionada pelos árbitros e não propriamente
garantia de uma execução futura, competindo aos árbitros a decisão a
respeito”, conclui o relator. A decisão foi unânime.