O contribuinte deve ser informado que possui débitos fiscais e
terá a conta corrente bloqueada, assim como suas aplicações financeiras,
se não quitá-los ou oferecer bens para penhora. A decisão é da 1ª Turma
do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para advogados, o entendimento
protegerá os contribuintes de "bloqueios surpresa" das contas bancárias
pelo sistema Bacen-Jud do Banco Central - que permite a penhora on-line.
No caso analisado, que tratava de um processo da Braskem, os
ministros definiram também que a medida só pode ser efetuada por um
pedido do credor - no caso, a Fazenda Nacional. "A constrição de ativos
não pode ser determinada de ofício pelo magistrado", disse o relator do
recurso, ministro Napoleão Nunes Maia Filho.
É a primeira vez que o STJ traz essa linha de orientação, "que
privilegia a ampla defesa e o devido processo legal", segundo a advogada
Ariane Guimarães, do escritório Mattos Filho Advogados.
No processo, a Braskem discutia na Justiça da Bahia a cobrança de
débitos do PIS. O juiz da execução fiscal na primeira instância bloqueou
valores da conta corrente da petroquímica antes de notificá-la. O
Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, com sede em Brasília,
reformou a decisão. O entendimento foi de que se o devedor não foi
citado não há "razoabilidade jurídica" no pedido de penhora de ativos.
Procurada pelo Valor, a empresa preferiu não comentar o assunto.
No julgamento, os ministros da 1ª Turma do STJ, por unanimidade,
concordaram com a tese dos contribuintes. O relator do recurso, ministro
Napoleão Nunes Maia Filho, baseou-se no artigo 185-A do Código
Tributário Nacional (CTN). Pela norma, o magistrado poderá bloquear
contas bancárias caso o devedor citado não apresente bens à penhora em
cinco dias. O ministro ainda afirmou que deve haver pedido de bloqueio
pelo credor.
Advogados afirmam que a decisão é importante para frear juízes que
costumam congelar bens pelo sistema Bacen-Jud sem citar o devedor e
mesmo sem a solicitação do credor do débito. Ainda segundo advogados, o
Tribunal Regional Federal da 3ª Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul)
tem autorizado o bloqueio antes da citação do devedor. "Muitos clientes
já souberam do bloqueio pelo gerente da conta bancária", diz Marcelo
Della Mônica, do Demarest & Almeida Advogados. "Há juízes que fazem
vista grossa para princípios constitucionais e de legalidade."
Anualmente, bilhões de reais são bloqueados pelo sistema Bacen-Jud.
De acordo com o último levantamento disponibilizado pelo Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), R$ 17 bilhões foram penhorados de janeiro a
agosto de 2012. Em 2011, o volume bloqueado chegou a R$ 22 bilhões.
Segundo o Banco Central, em 2012, foram registrados 4,9 milhões de
pedidos de bloqueio on-line. Pouco mais do que no ano anterior: 4,5
milhões de solicitações. Até março deste ano, já foram feitos 1,1 milhão
de pedidos.
De acordo com o advogado Antonio de Pádua Soubhie Nogueira, sócio do
Ávila, Nogueira e Miguel Neto Advogados, o problema "bloqueio surpresa" é
comum em todas as áreas do direito. "Os juízes acham que os devedores
vão esvaziar os cofres. Presumem que todos são bandidos", afirma.
Nogueira diz ainda que nem mesmo os créditos alimentares e trabalhistas
podem ser motivo para o juiz efetuar o bloqueio sem a ciência do
devedor.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) já recorreu da
decisão da 1ª Turma. Para o órgão, o julgamento no caso da Braskem é
isolado e diferente do que já decidiu o STJ. "A PGFN defende a
possibilidade de bloqueio de ativos, e não de penhora, antes da citação
quando se torna necessário garantir o recebimento do crédito
tributário", afirma a procuradora Alexandra Carneiro, coordenadora da
atuação da PGFN no STJ.
Em 26 de março, o ministro Mauro Campbell Marques, em decisão
monocrática, decidiu que o juiz pode bloquear valores da conta bancária
antes de citar o devedor. No caso, porém, o débito exigido não era
tributário. "Apesar de termos a mesma lei que regula o procedimento de
execução, o crédito tributário possui garantias diferenciadas em relação
às demais dívidas públicas", diz Ariane Guimarães, do Mattos Filho.
A 1ª Seção do STJ já decidiu, em recurso repetitivo, que é possível
realizar a penhora on-line de depósitos bancários e aplicações
financeiras antes do fim das buscas para encontrar outros bens. Naquela
ocasião, entretanto, não ficou definido se o bloqueio de contas poderia
ser decretada sem pedido da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
(PGFN) ou antes da citação do devedor. Nesse processo, o STJ afirmou não
ser possível analisar a questão porque seria necessário o reexame de
provas, o que é proibido pela Súmula nº 7 da própria Corte.