Isso porque, nos termos do padrão contábil vigente na mencionada lei,
o ágio pago na aquisição de empresas deixou de ser amortizado para fins
contábeis. Todavia, surgiu uma dúvida relacionada à possibilidade de se
continuar amortizando este ágio para fins fiscais, quando que para fins
comerciais esse ágio não mais seria amortizado.
Resumidamente, pode-se definir o ágio como a diferença entre o preço
pago, ou seja, o custo da aquisição, e o patrimônio líquido da empresa
adquirida. De acordo com os termos da lei 9.532/97,
após a incorporação da sociedade adquirida pela sociedade adquirente,
ou vice-versa, o ágio registrado na contabilidade da empresa investidora
terá seu tratamento tributário definido de acordo com sua natureza.
O ágio justificado com base no valor de mercado dos ativos da empresa
adquirida deverá ser alocado ao custo do bem ou direito que lhe deu
causa, para fins de futura depreciação, amortização ou apuração de ganho
ou perda de capital. O ágio justificado com base na rentabilidade
futura da empresa adquirida deverá ser registrado (para fins fiscais)
como ativo diferido, sujeito à amortização de no máximo 20% por ano. O
ágio justificado com base em outras razões econômicas e intangíveis não
poderá ser amortizado para fins fiscais, permanecendo como custo do
ativo adquirido para futura baixa.
Todavia, a análise do processo legislativo que levou à aprovação da
lei 11.638/07 permite afirmar que tais mudanças tiveram por objetivo
harmonizar a legislação contábil brasileira aos padrões contábeis
internacionais.
Com o propósito de mitigar as dúvidas existentes geradas pela lei
11.638/07, na apuração das bases de cálculos de tributos federais, foi
editada a Medida Provisória 449/08, pondo fim à insegurança causada pela referida lei. Em 2009 foi sancionada a lei 11.941/09,
resultado da mencionada medida provisória, que dentro de outras
medidas, confirmou a criação do Regime Tributário de Transição (RTT),
que busca neutralizar os impactos da adoção dos novos critérios
contábeis instituídos pela lei 11.638/07.
Desta forma, para os anos calendário 2008 e 2009, a adoção do RTT era
opcional, sendo que esta informação devia ser manifestada para os dois
anos em conjunto na Declaração de Informações Econômico-Fiscais da
Pessoa Jurídica de 2009 (calendário 2008). A partir de 2010 a adoção do
RTT passou a ser obrigatória e valerá até a entrada em vigor de lei que
discipline especificamente os efeitos tributários de cada um dos novos
métodos e critérios contábeis aplicáveis a partir da edição da
legislação em referência.
Em síntese, para as empresas sujeitas ao RTT, a determinação das
bases de cálculo do IRPJ, da CSL, do PIS e da COFINS será efetuada com
base nos métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de
2007, ou seja, sem levar em conta os efeitos das alterações contábeis
introduzidas pela lei 11.638/07, pelos artigos 37 e 38 da lei 11.941/09,
ou ainda pelos normativos da CVM.
Vale notar que o artigo 23 do texto final da MP 449/08 foi vetado
pelo presidente da República, que "a fim de preservar a neutralidade
tributária prevista no § 1º do art. 15 desta lei, os métodos e critérios
contábeis introduzidos pela lei 11.638/07, relativos às contrapartidas
de aumentos ou diminuições de valores atribuídos a elementos do ativo e
do passivo, em decorrência de sua avaliação a valor justo ou a valor
presente, não produzirão efeitos para fins de imposto de renda, da CSLL,
da COFINS e PIS/PASEP".
Tal veto suscitou vários debates a respeito da eventual possibilidade
desses ajustes (elementos do ativo e do passivo a valor justo ou a
valor presente, como exigido pelos artigos 183, I, "a" e 184, III da lei
das S.A.) terem ficado excluídos da neutralidade do RTT. Não obstante
dúvidas existam no sentido do fisco eventualmente adotar essa posição,
apresenta-se como a melhor interpretação aquela no sentido de que os
artigos 16 e 17 da lei 11.941/07 garantem a neutralidade tributária para
toda e qualquer receita, custo ou despesa gerada a partir da adoção dos
novos métodos contábeis, isto é, que não ocorreriam se fossem aplicados
os métodos e critérios contábeis vigentes em 31/12/07. Desta forma,
estariam naturalmente incluídos os efeitos fiscais decorrentes dos
ajustes de elementos do ativo e do passivo a valor justo e a valor
presente.
Finalmente, a lei 11.941/09 modificou também o artigo 226, §3º da lei
das S.A., ao acrescentar o artigo 185-a, determinando que a CVM
estabelecerá normas especiais de avaliação e contabilização aplicáveis à
aquisição de controle, participações societárias ou segmentos de
negócios, bem como às operações de fusão, incorporação e cisão
envolvendo companhias abertas.
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*José Maria Meirelles é sócio do escritório Angélico Advogados.