A Receita Federal em São Paulo descobriu uma nova fraude que vem
ganhando força no Estado. O golpe envolve a criação de falsos créditos
tributários para abatimento de débitos de impostos e contribuições
federais. O Fisco calcula que nos últimos meses cerca de R$ 110 milhões
foram lançados indevidamente. Em função da maior frequência no uso do
golpe, a Receita em São Paulo iniciou nova fiscalização na qual tem
feito acompanhamento mensal e até semanal da utilização de créditos
fiscais.
Como tem cinco anos para fiscalizar e autuar, a Receita privilegia a
análise de operações que estejam na iminência de ultrapassar esse
período. É exatamente esse prazo que os fraudadores vêm usando a seu
favor. Na prática, os golpistas utilizam o preenchimento de um documento
eletrônico chamado de PER/DCOMP, por meio do qual as empresas declaram o
pagamento de tributos com a compensação de créditos. O preenchimento
dessa declaração não deixa muita margem para manipulação porque seus
dados são muito amarrados com informações fornecidas à Receita por meio
de outros documentos eletrônicos.
Há, porém, uma brecha que está sendo aproveitada por golpistas: um
campo no qual a empresa pode declarar créditos tributários com
habilitação solicitada em processos administrativos. Nesse campo, são
informados os dados do suposto crédito, o tributo a que se refere e seu
valor. Segundo técnicos da Receita, em alguns casos esses processos
administrativos existem, mas são de assuntos e valores diversos do
declarado. Em outros casos, o processo administrativo está registrado no
sistema, mas não há processo físico, o que indicaria envolvimento de
servidores públicos no esquema de fraude.
Segundo técnicos da Receita, a declaração falsa é feita por
consultores golpistas que oferecem uma operação de redução ou de
eliminação do débito tributário para as empresas. "Possivelmente, as
empresas contribuintes não sabem como a operação é feita. A solução
oferecida por esse consultores atrai porque a remuneração pedida pelo
serviço é cobrada somente depois que o débito é efetivamente reduzido ou
eliminado", diz um técnico da Receita.
Pedro César da Silva, da Athros ASPR Auditoria e Consultoria, explica
que os golpistas possivelmente usam processos administrativos nos quais
o crédito é habilitado em 30 dias, caso não haja manifestação em
contrário da Receita Federal. Danila Bernardi, consultora da Athros
ASPR, lembra que o uso de crédito tributário originado de ação judicial
precisa ser habilitado via processo administrativo. Ela explica que, no
formulário eletrônico, o campo de compensação por crédito habilitado
dessa forma permite o preenchimento livre e, por enquanto, não há
vinculação automática por meio do número do Cadastro Nacional de Pessoa
Jurídica (CNPJ), como acontece com outros dados.
De acordo com o advogado Daniel Mariz Gudiño, do Dannemann Siemsen
Advogados, o fato de a Receita normalmente não conferir os valores ou a
existência dos processos administrativos pouco tempo depois de o
contribuinte colocar os dados para compensação na PER/DCOMP garante que o
processo seja mais célere, apesar de permitir ações fraudulentas. "Isso
permite a fraude, mas a Receita não está equipada hoje para fazer a
fiscalização em um curto espaço de tempo", diz.
"Se a Receita fixar um prazo menor para fiscalização, ela realmente
não conseguiria dar conta", completa a advogada Manuella Vasconcelos
Falcão, do Bichara, Barata, Costa & Rocha Advogados. Já o advogado
Tácio Lacerda Gama, do Barros Carvalho Advogados, acredita que seria
possível a Receita cruzar os dados com mais agilidade "Ela tem
tecnologia para fazer isso de maneira rápida."
Gudiño afirma que a multa por fraudes como essa podem chegar a 150%
do débito compensado, e só seria aplicada ao contribuinte. Já na esfera
criminal, ele acredita que todos os envolvidos na fraude devam
responder. A pena seria de dois a cinco anos de prisão, e em ambos os
casos, a responsabilidade pela empresa recairia sobre sócios ou
representantes.