Recente decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF),
relatada pelo ministro Joaquim Barbosa, explicitou que os sócios que
vierem a ser responsabilizados por créditos tributários da pessoa
jurídica que são reclamados pela administração tributária devem ser
intimados para participar dos atos que culminam na constituição
definitiva dos referidos créditos.
O ministro Joaquim Barbosa, no julgamento do RE 608.426 AgR, decidiu
que os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa
aplicam-se indistintamente a qualquer categoria de sujeito passivo,
irrelevante a sua nomenclatura legal (contribuintes, responsáveis,
substitutos, devedores solidários etc), na fase de constituição do
crédito tributário. Além disso, a inclusão de terceiros como
responsáveis pelos débitos tributários sem a demonstração das
circunstâncias legais que levaram a tanto é uma ficção inadmissível no
âmbito do direito público.
Se por um lado não havia dúvida de que os princípios do contraditório
e da ampla defesa são aplicáveis ao processo administrativo (STF, RE
388.359, relator ministro Marco Aurélio; ADI 1976, relator ministro
Joaquim Barbosa), os sócios que eram chamados para responder por esses
débitos em executivos fiscais não encontravam acolhida no Poder
Judiciário em relação ao argumento de que teria ocorrido violação ao
exercício do direito constitucional do contraditório e da ampla defesa
quando não eram intimados para participar do processo administrativo de
constituição do crédito tributário.
A notificação encaminhada para a empresa se manifestar em processo
administrativo tributário não implica a presunção de que os sócios
tenham ciência dos fatos que em tese acarretam a sua responsabilidade.
Acaso cabível, essa presunção diria respeito ao próprio crédito
tributário e não aos fatos que justificam a responsabilidade de
terceiros, que devem ser claramente explanados e fundamentados.
O acolhimento dessas alegações encontra barreira na posição do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), fixada em recurso representativo da
controvérsia, de que o sócio cujo nome foi incluído na certidão de
dívida ativa antes do ajuizamento do executivo fiscal deve apresentar
sua defesa mediante a oposição de embargos à execução (REsp 1.104.900,
relatora ministra Denise Arruda; REsp 1.110.925, relator ministro Teori
Albino Zavascki).
A jurisprudência do STJ deve evoluir, acolhendo os julgados do Supremo
Isso quer dizer que o sócio pode ser surpreendido com a inscrição do
seu nome em dívida ativa, em que pese não ter sido intimado para
participar do procedimento que deu origem ao crédito em cobro, o que
significa que somente depois de garantido o suposto crédito tributário é
que poderá apresentar defesa e alegar, dentre outras questões, a
nulidade do processo administrativo em relação a sua pessoa em razão da
violação de direitos que lhe são constitucionalmente assegurados.
Esse procedimento da administração tributária (de incluir sócios ou
administradores no polo passivo de execução fiscal sem que tenham
participado do processo administrativo) já não era aceitável após o STF
ter decidido que o sócio não é responsável pelos débitos tributários da
empresa pelo simples fato de ter quotas da mesma (RE 562.276, relatora
ministra Ellen Gracie), pois o artigo 135 do Código Tributário Nacional
responsabiliza a direção, gerência ou representação da pessoa jurídica
exclusivamente quando praticarem atos com excesso de poder ou infração à
lei, contrato social ou estatutos, hipóteses dentre as quais não se
inclui o simples inadimplemento de tributos (Súmula 430 do STJ).
A partir da interpretação conjunta dos julgados do STF no RE 608.426
AgR e no RE 562.276 é possível afirmar que o referido tribunal entende
que a administração tributária, ao realizar o lançamento do crédito
tributário, deve fazê-lo desde logo contra o terceiro, demonstrando
claramente (sem presunções) as circunstâncias legais que o solidarizam
com o débito tributário da pessoa jurídica, facultando a este o
exercício do contraditório e da ampla defesa.
Nesse momento, o terceiro solidário deve não só apresentar sua defesa
administrativa em relação aos fundamentos que o tornam responsável pelo
crédito tributário, mas também aqueles que combatem a própria exigência
do crédito tributário.
Se a administração tributária inscrever o débito em dívida ativa
incluindo o nome do sócio como responsável, sem que este tenha
participado do processo administrativo de lançamento, o contribuinte
pode alegar violação ao devido processo legal e à ampla defesa ainda que
seu nome conste da certidão de dívida ativa.
Nesse ponto, a jurisprudência do STJ deve evoluir, acolhendo os
julgados do STF, para permitir que os sócios requeiram sua exclusão do
polo passivo mediante a apresentação de exceção de pré-executividade,
isto é, sem que haja a constrição de bens de seu patrimônio, quando
restar demonstrado que não foram intimados para se manifestar no
processo administrativo de constituição do crédito tributário.
Guilherme Cezaroti é advogado da área tributária do escritório Campos Mello Advogados
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