A
2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu que um argumento usado
pela defesa nas instâncias ordinárias, mas que não foi abordado na
decisão de segunda instância, não gera a rejeição do recurso.
A
decisão se deu no julgamento de Embargos de Divergência que comparava
acórdão da 2ª Seção e decisão da 3ª Turma do STJ, que não admitiu o
exame do fundamento apontado nas contrarrazões de Recurso Especial. Para
os ministros da turma, faltou o requisito do prequestionamento por
ausência de pronunciamento sobre o tema pelo tribunal de segunda
instância.
"O Superior Tribunal de Justiça tem a importante
missão de uniformizar a interpretação da legislação infraconstitucional
e referido julgado simplesmente referenda o cumprimento de tal mister,
além de representar uma tendência de inaplicar a jurisprudência
defensiva, em prol de um menor rigorismo no conhecimento dos recursos
e, ao assim proceder, aplicar o
direito ao caso concreto e resolver o litígio", avalia o representante da parte embargante, o advogado Rafael de Assis Horn no memorial entregue aos ministros da 2ª Seção.
O
relator do caso na 2ª Seção foi o ministro Massami Uyeda, que não
conheceu dos Embargos de Divergência por entender que não estava
demonstrada a similitude fática entre as decisões comparadas.
Acompanharam o voto os ministros Luis Felipe Salomão e Nancy Andrighi.
A
ministra Isabel Gallotti divergiu dos colegas. Pediu vista dos autos e o
seu voto prevaleceu no julgamento. Segundo ela, o acórdão contestado da
3ª Turma e o paradigma da 2ª Seção chegaram a conclusões opostas ao
examinar a possibilidade de um fundamento invocado pela parte vencedora
na instância de origem, mas não examinado no acórdão recorrido, ser
analisado pelo STJ após o conhecimento do Recurso Especial, na fase de
exame de mérito.
Ela explicou com detalhes sua interpretação sobre
o assunto: segundo a tese adotada pela 3ª Turma, havendo dois
fundamentos autônomos de defesa e tendo o acórdão dado ganho de causa ao
recorrido, analisando apenas um desses fundamentos e não se
pronunciando quanto ao outro, no caso de o STJ não concordar com o
fundamento adotado no tribunal de origem, o segundo fundamento não
poderá ser analisado depois de ultrapassada a fase de conhecimento do
Recurso Especial, ainda que ele seja reiterado nas contrarrazões.
No
julgamento dos Embargos, apontou a ministra, a 2ª Seção decidiu que,
tendo o fundamento de defesa sido alegado na instância ordinária, mesmo
que não abordado pelo tribunal de origem, caberia seu exame pelo STJ, se
ultrapassada a barreira do conhecimento do recurso especial.
Voto de Galloti
O que os Embargos discutiam era a preclusão — como é chamada a perda da
oportunidade de exercício de um direito processual — sobre a definição
dos valores de bens em processo de inventário.
A 3ª Turma havia
dado parcial provimento ao Recurso Especial para determinar que os bens
fossem avaliados conforme o valor que possuíam na época da abertura do
inventário. Por falta de prequestionamento, a alegação de preclusão não
foi analisada, mesmo tendo sido apresentada nas contrarrazões do Recurso
Especial.
A ministra frisou: o caso julgado não trata da análise
de regra técnica de admissibilidade de Recurso Especial em Embargos de
Divergência, hipótese vedada pela jurisprudência do tribunal. O Recurso
Especial não foi apresentado pelo embargante, que suscitou a preclusão
nas contrarrazões ao recurso apresentado pela parte contrária.
Segundo
Isabel Gallotti, caso a alegação de preclusão não tivesse sido feita
pela embargante em nenhuma oportunidade nas instâncias ordinárias, como
alega a embargada, não haveria divergência apta a motivar o conhecimento
dos embargos. Não foi o que aconteceu.
Ela lembrou que a
preclusão foi alegada. A embargante foi vencedora nas instâncias
ordinárias e o acórdão recorrido não se manifestou sobre a alegação de
preclusão. Como a decisão lhe foi favorável, não havia interesse na
interposição de recurso especial nem na oposição de embargos de
declaração para preparar um recurso especial.
Uma vez que o
Recurso Especial foi interposto pela parte vencida, vieram as
contrarrazões com a reiteração do argumento de que a questão do critério
da avaliação dos bens já estava preclusa, sem recurso contra isso.
"A
questão da preclusão foi minuciosamente alegada em contraminuta ao
agravo de instrumento na origem; em contrarrazões ao recurso especial e
em embargos de declaração ao acórdão embargado", ressaltou a ministra.
"Mais não se lhe poderia ser exigido, senão mediante o atropelo do
princípio processual segundo o qual não tem interesse em recorrer a
parte plenamente vitoriosa", concluiu.
Com a decisão, a 3ª Turma
poderá examinar como entender de direito a questão relativa à preclusão
da definição dos valores de bens no processo de inventário. Com informações da Assessoria de Comunicação do STJ.
EREsp 595.742
Revista Consultor Jurídico, 1º de março de 2012