Uma decisão da Justiça Federal de São Paulo impediu a Receita
Federal de aplicar multa isolada de 50% sobre pedidos de compensação ou
ressarcimento de créditos de tributos federais - como PIS, Cofins e IPI -
considerados indevidos. A sentença, a primeira coletiva que se tem
notícia sobre o assunto, beneficia os 51 associados da União Brasileira
de Avicultura (Ubabef). A multa foi instituída pela Lei Federal nº
12.249, de junho de 2010.
Até a edição da norma, a Receita Federal cobrava apenas uma multa de
20% por atraso no pagamento do tributo. Agora, aplica também a multa de
50%, que fez cair pela metade o volume de pedidos de compensação
tributária, segundo informações divulgadas pelo Fisco.
A sentença, proferida em dezembro, é da juíza federal da 14ª Vara
Federal Cível de São Paulo, Cláudia Rinaldi Fernandes. Na decisão, ela
afirma que a multa só pode ser aplicada quando a Receita Federal
comprovar que houve má-fé do contribuinte, respeitando, porém, o seu
direito de defesa. "Em síntese, conclui-se que a alteração introduzida
pela Lei 12.249 acabaria por atingir contribuintes de boa-fé, padecendo,
neste ponto, de inequívoca inconstitucionalidade", diz a magistrada na
decisão. A Brasil Foods, uma das associadas beneficiadas, foi procurada
pelo Valor, mas preferiu não comentar o assunto.
De acordo com o advogado Marcelo Salomão, sócio do Brasil, Salomão e
Matthes Advocacia, que representa a entidade no processo, os avicultores
o procuraram para obter uma medida preventiva. "Por conta das
exportações, eles acumulam muitos créditos de PIS, Cofins e IPI",
explica. A legislação brasileira permite que empresas com créditos de
tributos federais possam buscar o ressarcimento ou compensação - uso de
créditos para pagar outros tributos federais. Mas, com a criação da
pesada penalidade, as associadas da Ubabef preferiram ir à Justiça para
não correrem o risco de ser multadas.
Proposto em maio do ano passado, o mandado de segurança teve o pedido
de liminar negado porque a juíza considerou não haver urgência. Ela
também pretendia ouvir os demais envolvidos. O Ministério Público
pronunciou-se a favor do pedido da entidade. Declarou que a cobrança da
multa de 50% fere o princípio do devido processo legal ao não permitir a
defesa dos contribuintes. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
(PGFN) também manifestou-se no processo. Procurada pelo Valor, informou apenas que vai recorrer da decisão.
Um dos principais argumentos da Ubabef, segundo Salomão, é o de que a
Lei nº 12.249 viola o direito constitucional de petição. "Não posso ser
punido por defender um direito meu", diz. O advogado também alegou que a
multa só deve ser aplicada em razão de ato ilícito, o que não seria o
caso.
Para o advogado Fábio Calcini, também do Brasil, Salomão e Matthes
Advocacia, o alto valor da multa - 50% do valor do crédito a ser
ressarcido ou compensado - fere os princípios da proporcionalidade e da
razoabilidade. "Uma multa dessa pode quebrar uma pequena empresa",
afirma o advogado.
Uma das associadas da Ubabef, a Doux Frangosul, já havia obtido uma
sentença individual do juiz Adriano Copetti, da Justiça Federal de Santa
Cruz do Sul (RS). Ele também afastou a cobrança da multa de 50%, exceto
se for caracterizada a má-fé do contribuinte. Segundo o advogado
Matheus Brenner, do departamento jurídico da companhia, a Receita
recorreu e a ação está em andamento. Ele afirma que a empresa chegou a
ser multada em 50%, logo que a Lei 12.249 entrou em vigor, e discute o
assunto em âmbito administrativo. "Mas a sentença a protege de eventuais
novas multas", diz.
Especialistas afirmam que as decisões sinalizam como o Judiciário
deverá posicionar-se sobre o tema. Uma empresa paulista, por exemplo,
discute na esfera administrativa uma multa de R$ 150 mil, aplicada com
base na Lei 12.249. "Recorremos à via administrativa porque ainda não há
uma decisão judicial final", explica o advogado Renato Nunes, do Nunes e
Sawaya Advogados, que representa a empresa no processo.