As decisões do STJ que marcaram 2011
O
STJ superou a marca de 309 mil decisões em 2011. Muitas delas atingem
diretamente o dia a dia do cidadão, ao estabelecer a correta
interpretação de leis relativas a temas como saúde, consumo e família. O
STJ também se posicionou em relação a casos de grande repercussão
nacional. Reveja, a seguir, algumas das principais decisões proferidas
pelo Tribunal da Cidadania neste ano que está terminando.
Família
As
ações que discutem direito de família geralmente são polêmicas e geram
muito debate. No ano de 2011 não foi diferente. Um dos julgados (REsp
1.183.378) de maior repercussão foi da 4ª turma do STJ, que, em decisão
inédita, proveu recurso de duas mulheres que pediam para ser habilitadas
ao casamento civil (clique aqui).
Seguindo
o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, a turma concluiu que a
dignidade da pessoa humana, consagrada pela CF/88 (clique aqui),
não é aumentada nem diminuída em razão do uso da sexualidade, e que a
orientação sexual não pode servir de pretexto para excluir famílias da
proteção jurídica representada pelo casamento.
Outra
questão definida pelo STJ foi o REsp 1.186.086, que concedeu ao avô a
guarda consensual de uma criança. A 3ª turma entendeu que se trata de
uma autorização excepcional, já que a filha e o neto moravam e dependiam
dele desde o nascimento da criança (clique aqui).
O
ministro Massami Uyeda, relator do caso, afirmou que a melhor
compreensão da matéria recomendava conceder a guarda do neto para o avô
materno. Ele frisou que não se trata apenas de conferir ao menor
melhores condições econômicas, mas também regularizar um forte vínculo
de afeto e carinho entre avô e neto, tudo isso com o consentimento da
mãe.
Outro
caso importante foi o julgamento do REsp 912.926, em que se entendeu
não ser possível a existência de duas uniões estáveis paralelas (clique aqui).
Para os ministros da 4ª turma, a lei exige como um dos requisitos
fundamentais para o reconhecimento da união estável o dever de
fidelidade, e ainda incentiva a conversão da união em casamento. O
relator foi o ministro Luis Felipe Salomão.
Saúde
Ao
longo do ano, muitos julgamentos importantes sobre esse assunto
aconteceram. No REsp 1.145.728, o STJ manteve a indenização por danos
materiais e morais concedida a um casal de MG e sua filha, que sofreu
graves sequelas em decorrência da falta de prestação de socorro após o
parto (clique aqui).
Os ministros da 4ª turma entenderam que os valores não eram exagerados e
que a realização de nova análise dos fatos, para eventualmente se negar
a indenização, esbarraria na súmula 7/STJ, que impede o reexame de
provas em REsp.
Operadoras
de planos de saúde não precisam ingressar com ação judicial para
cancelar contratos de consumidores que estejam com mensalidades em
atraso há mais de dois meses. Ao julgar o REsp 957.900, os ministros da
4ª turma entenderam que basta a notificação da empresa aos
inadimplentes, com antecedência, para ela poder rescindir o contrato.
O
ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do caso, afirmou que, ao
considerar imprescindível a propositura de ação para rescindir o
contrato, o TJ/SP havia criado exigência não prevista em lei. Ele
ressaltou que "a lei é clara ao permitir a rescisão unilateral do
contrato por parte da operadora do plano de saúde, desde que fique
comprovado o atraso superior a 60 dias e que seja feita a notificação do
consumidor".
No
REsp 1.230.233, a 3ª turma restabeleceu sentença que determinou à
Unimed o pagamento de cirurgia bariátrica a um segurado de Varginha/MG (clique aqui).
A turma, seguindo voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, concluiu
que no ato da assinatura do contrato, a seguradora sabia da obesidade
mórbida do segurado, sendo evidente que os respectivos riscos certamente
foram levados em consideração e aceitos ao admiti-lo como segurado, não
se podendo falar em vício na manifestação da vontade.
Para
a relatora, quando o segurado procurou a Unimed, ele buscava um seguro
que oferecesse cobertura para os riscos à sua saúde, principalmente
aqueles derivados do seu sobrepeso. A seguradora, por sua vez, mesmo
ciente do quadro de obesidade mórbida do segurado, concordou em firmar o
contrato. Por essa razão, a prevalecer a boa-fé contratual, não há como
admitir a recusa da Unimed em oferecer cobertura para um sinistro
derivado especificamente da obesidade mórbida do segurado, sob pena de
estar negando vigência àquilo que as partes tinham em mente quando
celebraram o contrato.
Por
fim, a ministra concluiu que antes de concluir o contrato de seguro de
saúde, pode a seguradora exigir do segurado a realização de exames
médicos para constatação de sua efetiva disposição física e psíquica,
mas, não o fazendo e ocorrendo sinistro, não se eximirá do dever de
indenizar, salvo se comprovar a má-fé do segurado ao informar seu estado
de saúde.
Já
no REsp 1.256.703, a 4ª turma reconheceu a um hospital particular de SP
o direito de cobrar por atendimento médico de emergência prestado sem
apresentação prévia do orçamento e sem assinatura do termo de contrato. O
caso julgado foi de uma menina socorrida por policiais militares, após
convulsão, e levada na viatura ao hospital (clique aqui).
Para
o ministro Luis Felipe Salomão, relator, a necessidade de assinatura
prévia do contrato e de apresentação do orçamento para o atendimento
médico deixaria o hospital "em posição de indevida desvantagem", pois
"não havia escolha que não fosse a imediata prestação de socorro".
"O
caso guarda peculiaridades importantes, suficientes ao afastamento,
para o próprio interesse do consumidor, da necessidade de prévia
elaboração de instrumento contratual e apresentação de orçamento pelo
fornecedor de serviço", afirmou Salomão. O ministro acrescentou que
a elaboração prévia de orçamento, nas condições em que se encontrava a
paciente, "acarretaria inequívocos danos à imagem da empresa, visto
que seus serviços seriam associados à mera e abominável mercantilização
da saúde".
Meio ambiente
Com
base no princípio da insignificância, a 5ª turma cassou decisão que
condenou um pescador à prestação de serviços à comunidade por pescar
dentro da Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, localizada no norte da
ilha de SC, onde fica a capital do Estado, Florianópolis.
O
pescador foi preso em flagrante em seu barco, próximo à Ilha Deserta,
pertencente à Reserva do Arvoredo. Foram apreendidos com ele equipamento
de pesca e 12 kg de garoupa (REsp 905.864).
A
relatora, ministra Laurita Vaz, considerou inexpressiva a lesão ao meio
ambiente, aplicando, então, o principio da insignificância. Para ela, a
quantidade apreendida de peixe – 12 kg – representaria três ou quatro
garoupas.
No
julgamento do REsp 1.264.302, a 2ª turma entendeu que o MPF deve
manifestar-se em causa na qual se discute nulidade de auto de infração
ambiental porque, na maior parte das vezes, o interesse envolvido
transcende o interesse meramente patrimonial no crédito gerado,
abarcando discussões de cunho substancial que dizem respeito ao meio
ambiente em si. O recurso era de uma cidadã autuada pelo Ibama.
DPVAT
Ao
julgar o REsp 1.120.676, a 3ª turma determinou o pagamento de
indenização pelo DPVAT aos pais de um nascituro morto em um acidente de
trânsito (clique aqui).
A mãe, grávida de uma menina, conduzia uma bicicleta em via pública
quando se envolveu em acidente com um veículo automotor. A filha faleceu
quatro dias depois, ainda no ventre materno.
Com
35 semanas de vida intrauterina, nono mês de gestação, o colegiado
concluiu, com base em conceitos científicos, que a menina era plenamente
hábil à vida pós-uterina, autônoma e intrinsecamente dotada de
individualidade genética e emocional.
Já
no REsp 1.185.100, os ministros da 4ª turma decidiram que é indevida a
indenização decorrente do DPVAT, se o acidente ocorreu sem o
envolvimento direto do veículo. O recurso era de um trabalhador de MS
que reclamava indenização por uma queda ocorrida quando descia de uma
carreta estacionada.
Segundo
o relator do caso, a improcedência do pedido decorreu do fundamento de
que o veículo há de ser o causador do dano, e não mera "concausa passiva
do acidente". O ministro examinou a adequação da ação em razão da
possibilidade e da probabilidade de determinado resultado ocorrer, o que
vale dizer que a ação supostamente indicada como causa deve ser idônea à
produção do resultado.
Imóvel
Ao
julgar o REsp 1.269.474, a 3ª turma anulou leilão de imóvel penhorado
ocorrido sete anos depois da avaliação judicial para fixação de seu
valor (clique aqui).
Para a turma, a expansão imobiliária e a valorização de imóveis no
Brasil na última década são fatos notórios, o que torna temerária a
simples atualização monetária do valor estimado na perícia inicial.
O
bem foi avaliado no ano de 2000 em R$ 4,9 mi. Atualizado pelos índices
oficiais na data do leilão, em 2007, o valor alcançou R$ 8 mi,
resultando em arrematação por R$ 6,5 mi. A executada, porém, apresentou
laudos estimando o imóvel em R$ 13,6 mi em 2007 e R$ 37 mi em 2008.
Segundo
a ministra Nancy Andrighi, relatora, apesar do provável exagero na
última avaliação, correspondente à valorização de R$ 24 mi em apenas um
ano, não se pode supor que ao longo dos sete anos a valorização
imobiliária tenha correspondido apenas ao índice de correção monetária
oficial.
Já
no REsp 830.572, a 4ª turma restabeleceu indenização por danos morais a
um homem que aguardava havia 12 anos pela entrega de um imóvel cuja
construção sequer foi iniciada. Os ministros entenderam que, apesar de a
jurisprudência do STJ afirmar que o descumprimento de contrato acarreta
mero dissabor, a depender da peculiaridade do caso concreto é possível
constatar abalo moral.
Segundo
o relator, ministro Luis Felipe Salomão, em uma realidade carente de
soluções para o problema habitacional, em que a moradia constitui
elemento basilar para o exercício da cidadania, há que se atentar para o
fato de que o comprador, ao investir suas economias na aquisição do
sonho da casa própria, viu-se alvo de uma situação que exacerba a
naturalidade dos fatos da vida, causando séria e fundada aflição ou
angústia em seu espírito.
Para
o ministro, aquele não era um caso de mero dissabor advindo de
corriqueiro inadimplemento de cláusula contratual de menor importância.
Outro
julgado importante foi o REsp 1.139.030, que definiu que a cobrança de
cotas condominiais prescreve em cinco anos, a partir do vencimento de
cada parcela (clique aqui).
Para a turma, os débitos condominiais são dívida líquida constante de
instrumento particular e o prazo prescricional aplicável é o
estabelecido pelo artigo 206, parágrafo 5º, inciso I, do CC de 2002 (clique aqui).
No caso em questão, um condomínio carioca ajuizou ação de cobrança
contra um morador, requerendo o pagamento das cotas condominiais devidas
desde junho de 2001.
Bancos
No
julgamento do REsp 1.197.929, a 2ª seção determinou que instituições
financeiras devem responder de forma objetiva – ou seja,
independentemente de culpa – no caso de fraudes cometidas por terceiros,
indenizando as vítimas prejudicadas por fatos como abertura de contas
ou obtenção de empréstimos mediante o uso de identificação falsa (clique aqui).
Já
no REsp 884.346, os ministros da 4ª turma concluíram que terceiro de
boa-fé que recebe e apresenta cheque pós-datado (popularmente conhecido
como pré-datado) não está sujeito a indenizar seu emitente por eventuais
danos morais decorrentes da apresentação antes da data combinada (clique aqui).
O
entendimento foi dado em recurso de um posto de gasolina contra decisão
do TJ/SC. O relator do processo, ministro Luis Felipe Salomão,
considerou que a empresa não é obrigada a indenizar o emitente do
cheque, que teve seu nome negativado na Serasa.
Penal
Num dos julgamentos mais noticiados e comentados pela imprensa em 2011 (HC 149.250), a 5ª turma
considerou ilegais as investigações da Operação Satiagraha e anulou a
ação penal em que o banqueiro Daniel Dantas, do grupo Opportunity, havia
sido condenado por corrupção ativa (clique aqui).
Para
o colegiado, a operação da Polícia Federal foi ilegal em razão da
participação de funcionários da Abin - Agência Brasileira de
Inteligência. Por isso, as provas reunidas na investigação não poderiam
ser usadas em processos judiciais.
Já
no HC 219.610, a 5ª turma negou pedido de liberdade feito por José
Rainha Junior e Claudemir da Silva Novais, presos por serem suspeitos de
integrar organização criminosa voltada para a prática de crimes contra o
meio ambiente, de peculato, apropriação indébita e extorsão. O relator
do caso foi o ministro Gilson Dipp.
No
HC 228.097, a 6ª turma decidiu que o empresário e publicitário Marcos
Valério (figura central do escândalo do "mensalão") pode aguardar em
liberdade o julgamento do HC apresentado por sua defesa no STJ (clique aqui). O relator, ministro Sebastião Reis Júnior, concedeu liminar ao empresário.
Ele
foi preso preventivamente com outros três empresários, seus sócios,
devido a ordem expedida pelo juiz de Direito da cidade baiana de São
Desidério em decorrência da Operação Terra do Nunca 2. Deflagrada em
três Estados – BA, SP e MG, onde o publicitário foi preso –, a operação
investiga um provável esquema de aquisição de papéis públicos e grilagem
de terras em São Desidério, cidade localizada na região oeste da BA.
Outro
destaque da 5ª turma foi o julgado que concluiu que a pensão por morte a
ser paga ao menor sob guarda deve observar a lei em vigor na data do
óbito do segurado, pois esse é o fato gerador para a concessão do
benefício previdenciário: se o falecimento ocorreu antes da edição da MP
1.523, de 11 de outubro de 1996, o recebimento está assegurado; se a
morte ocorreu depois, o menor não tem direito ao benefício.
A
5ª turma definiu também que o menor sob guarda não pode mais ser
equiparado ao filho de segurado, para fins de dependência. De acordo com
o voto do relator, ministro Gilson Dipp, o reconhecimento do direito à
pensão por morte não é mais possível após as alterações promovidas pela
MP 1.523, reeditada até sua conversão na lei 9.528, em 10 de dezembro de
1997 (REsp 720.706).