De cada R$ 100 que a indústria de copos e utensílios de vidro
Nadir Figueiredo fatura, pouco mais de R$ 40 são para pagar tributos. E
de cada R$ 100 recolhidos em impostos e contribuições, outros R$ 2,50
são gastos com a estrutura necessária para cumprir obrigações
tributárias, como o envio de declarações, acompanhamento de mudanças de
legislação e controle de tributos devidos e já recolhidos.
"Gastamos cerca de 1% do faturamento para manter essa estrutura", diz
Raul Antonio de Paula e Silva, primeiro secretário do conselho de
administração da Nadir Figueiredo. "Isso é muito alto", avalia. "Na
Argentina o custo tributário não chega à metade do que representa no
Brasil. Na Bélgica, é menos de 20%", completa.
A Nadir Figueiredo é só um exemplo de empresa que perde parte
importante de sua margem com gastos para conseguir cumprir todas as
obrigações tributárias. Pesquisa da PricewaterhouseCoopers feita em 183
países mostra que o Brasil é disparado o local onde mais horas são
gastas para o cumprimento de obrigações tributárias. São 2.600 horas,
diante de uma média de 282 horas. Na Bolívia, segundo lugar na
classificação, é preciso 1.080 horas.
O frigorífico JBS mantém cerca de 150 pessoas para conseguir cumprir
as obrigações tributárias. "Não são pessoas que dão prejuízo, mas elas
não agregam valor à empresa", diz Francisco de Assis e Silva,
diretor-executivo de relações institucionais da companhia.
Cerca de 150 pessoas num total de 45 mil funcionários do grupo JBS
parece pouco, diz o diretor. Mas o custo de manutenção dessa estrutura
tributária representa 1% do lucro da empresa. O custo, diz, é
considerado pesado dentro de um mercado altamente competitivo.
O diretor da JBS lembra ainda que o cálculo leva em consideração as
35 unidades de negócios que o frigorífico mantém espalhadas em 11
Estados. Em cada uma das unidades há pelo menos duas pessoas para
controlar principalmente as mudanças de legislação do Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e manter a documentação em
ordem. A conta estima apenas os profissionais diretamente ligados à área
técnica de impostos. Considerando também a equipe de suporte que
permite o controle informatizado de dados e as emissões de certidões,
notas e outros documentos, o número, diz o diretor, sobe para dez
pessoas por unidade de negócio.
Mais do que o sobrenome em comum, Silva, da Nadir, e Silva, da JBS,
têm opinião semelhante sobre quais impostos são mais problemáticos: os
chamados tributos indiretos. O primeiro tributo que demanda maior
controle é quase sempre o ICMS, legislado de forma diversa pelos 26
Estados mais o Distrito Federal. Além do ICMS há também o PIS e a
Cofins, duas contribuições que, alvo de alterações na última década, são
cobradas sob diversas alíquotas, a despeito de terem um só ente
arrecadador: o governo federal.
Silva, da Nadir, diz que mantém seis pessoas somente para cuidar dos
indiretos ICMS, PIS e Cofins. A fabricante de copos lida com várias
alíquotas de ICMS, que variam de 4% a 18% conforme o Estado e o tipo de
operação. A substituição tributária, forma de cobrança pela qual o
imposto devido pelo varejo é antecipado pela indústria, acabou trazendo
mais complexidade ao sistema. Segundo o executivo da Nadir a nova
sistemática passou a repercutir no preço de negociação com os grandes
varejistas.
O sistema hoje, diz, faz as empresas suportarem custos de
fiscalização que seriam do Estado e o desenvolvimento tecnológico não
diminuiu a burocracia.
Atualmente, lembra Silva, da Nadir, as exportações representam menos
de 10% da receita da empresa. Quando as vendas ao exterior aumentam, a
empresa desloca mais pessoas para os tributos indiretos. Isso é
necessário porque aumenta a necessidade de controlar a contabilização
dos créditos de ICMS, PIS e Cofins.
Como as exportações são livres dos três tributos, as empresas podem
acumular os créditos dos tributos pagos na compra de insumos. Outras dez
pessoas, diz o executivo da indústria de copos, dedicam cerca de 40% de
seu tempo para outros tributos, como IR, INSS, FGTS, da esfera federal,
e ISS cobrado pelos municípios. Silva, da Nadir, não chega a
contabilizar nos seus custos a necessidade de contratação de escritórios
de advocacia e auditorias.
Para Silva, da JBS, o problema não se resume ao controle de créditos,
mas à diversidade e mudança nas normas. "As pessoas dormem com uma
legislação e acordam com outra. É uma situação caótica, principalmente
de ICMS."
A percepção de instabilidade das normas tributárias e de seu impacto
no custo parece generalizada. Há pouco mais de um mês, Tarek Farahat,
vice-presidente da Procter & Gamble e chefe das operações no Brasil,
disse em seminário na França que as empresas gastam entre 2% e 6% da
receita bruta para gerenciar a complexidade fiscal brasileira. A cada
dia, disse ele, surgem 40 mudanças na regulamentação fiscal.
A pesquisa da PricewaterhouseCoopers mostra que o ICMS, PIS e Cofins
consomem 1.370 horas das 2.600 necessárias para o cumprimento das
obrigações tributárias. Carlos Iacia, diretor da PricewaterhouseCoopers,
conta que o Brasil manteve o número de horas necessárias para o tema já
apontado pela mesma pesquisa em 2006. Não houve piora, mas também não
houve nenhum avanço, apesar de todas as discussões de reforma tributária
dos últimos anos. Para ele, o problema não se resume apenas ao custo
sobre lucro ou faturamento no cumprimento das obrigações tributárias. Há
ainda a questão da insegurança jurídica, principalmente em relação ao
ICMS que, além de alvo de constantes alterações, tem sido instrumento de
guerra fiscal entre os Estados. As empresas, diz, aproveitam benefícios
oferecidos legalmente e correm o risco de ter o incentivo invalidado
pelo Judiciário.