Demissão de servidor por improbidade não exige processo judicial
O servidor público condenado em processo
administrativo por ato de improbidade pode ser demitido
independentemente de condenação judicial. Com essa tese, a Terceira
Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou mandado de segurança
preventivo a um servidor do Ministério da Previdência Social que corre o
risco de perder o cargo por causa de uma contratação sem licitação.
De
acordo com o ministro Gilson Dipp, cujo voto foi seguido pela maioria
dos membros da Seção, a decisão judicial só é indispensável para a
aplicação das penas de suspensão de direitos políticos,
indisponibilidade de bens ou ressarcimento ao erário – previstas na Lei
de Improbidade (8.429/1992), mas não no Regime Jurídico Único do
funcionalismo federal, instituído pela Lei n. 8.112/1990.
O fato
que poderá levar à demissão do servidor foi a contratação da empresa
Vias (Instituto Virtual de Estudos Avançados), por quase R$ 20 milhões,
para desenvolver projeto de pesquisa de interesse do Ministério da
Previdência. A contratação ocorreu de modo direto, tendo sido a
licitação declarada inexigível. Ainda no início da execução do contrato,
o Tribunal de Contas da União e a Controladoria Geral da União
apontaram diversas irregularidades.
Segundo os órgãos de
controle, o caso não se enquadrava nas hipóteses de inexigibilidade de
licitação admitidas pela Lei n. 8.666/1993, pois a competição era
viável. Além disso, foram identificadas deficiências na justificativa da
escolha da empresa e dos preços ajustados. A comissão encarregada de
apurar as irregularidades em processo administrativo concluiu pela
ocorrência de ato de improbidade e sugeriu a demissão do subsecretário
de Planejamento, Orçamento e Administração do Ministério da Previdência.
Dois dos ministros que integram a Terceira Seção votaram pela
concessão do mandado de segurança para que o servidor não fosse demitido
em razão do processo disciplinar, sem prejuízo da possibilidade de
demissão futura por conta de eventual decisão judicial (em duas ações
judiciais movidas pelo Ministério Público sobre o mesmo caso, o
subsecretário da Previdência não figura como réu).
Para esses
ministros, o servidor só poderia perder seu cargo por improbidade se sua
conduta estivesse enquadrada na Lei n. 8.429, e nesse caso, conforme
determina o artigo 20, a perda da função apenas se efetivaria com o
trânsito em julgado da sentença condenatória.
No entendimento do
relator, ministro Napoleão Maia Filho, a partir da edição da Lei n.
8.429 não mais seria possível a demissão por improbidade mediante
processo administrativo – admitida pelo artigo 132, inciso IV, da Lei n.
8.112. Para ele, a situação anterior “deixava o servidor público em
completa insegurança quanto ao cometimento do ilícito denominado
improbidade administrativa, dando ensejo a promoções sancionatórias que
poderiam resvalar para motivações subjetivas”.
Sanções independentes
A
maioria da Seção, no entanto, seguiu o voto do ministro Gilson Dipp,
para quem os casos de improbidade não tratados pela Lei n. 8.429
continuam sujeitos ao estatuto dos servidores e podem ser apurados e
punidos em processo administrativo disciplinar. Assim também ocorre,
segundo o ministro, quando o fato se enquadra na Lei de Improbidade mas,
pela sua importância, não justifica as outras penalidades previstas por
ela, além da demissão.
A Lei n. 8.429 trata dos atos de
improbidade que impliquem enriquecimento ilícito (artigo 9º), lesão ao
erário (artigo 10) ou ofensa aos princípios da administração (artigo
11), prevendo as penas de demissão, suspensão de direitos políticos,
indisponibilidade de bens ou ressarcimento ao erário, “independentemente
das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação
específica”.
“Quando as infrações disciplinares alcançam
potencial de improbidade compatível (isto é, quando sujeitas à pena de
demissão, suspensão de direitos políticos, indisponibilidade de bens ou
ressarcimento ao erário), podem ser objeto de processo e aplicação das
penas previstas na Lei de Improbidade tanto como na lei funcional, mas
para a aplicação das penas de suspensão de direitos políticos,
indisponibilidade de bens ou ressarcimento ao erário, porque não há
previsão na lei funcional, só se procederá judicialmente”, afirmou
Gilson Dipp.
“Assim”, acrescentou o ministro, “quando se
pretende a caracterização de ato de improbidade previsto nos artigos 9º,
10 e 11 da Lei n. 8.429 e se pretende a aplicação das penalidades ali
previstas além da demissão, a investigação deve ser judicial. Ao
contrário, se a improbidade é de menor importância que não resulte na
penalização da Lei de Improbidade ou não constitua improbidade contra a
administração ou o erário, a pena administrativa, inclusive de demissão,
poderá ser imposta em processo administrativo”.
Para o ministro
Dipp, o fato de a lei do funcionalismo também estabelecer que o ato de
improbidade é causa para demissão não significa que as punições tenham a
mesma natureza. “A infração disciplinar e o ato de improbidade
legalmente submetem-se cada qual a regime peculiar, e sobretudo, por
essa mesma razão, não se excluem”, disse ele.
“É possível
admitir que uma infração disciplinar possa ser reconhecida como ato de
improbidade e sujeitar-se ao processo judicial correspondente, assim
como reconhecê-la como crime e sujeitá-la à ação penal, sem que, por uma
ou outra circunstância, seja inviabilizada a autonomia da investigação
administrativa disciplinar”, concluiu.
Gilson Dipp lembrou que a
Constituição admite a perda do cargo do servidor nas hipóteses de
sentença transitada em julgado e de processo administrativo em que seja
garantido o direito de defesa. Segundo ele, “o entendimento de que as
infrações disciplinares de improbidade, em qualquer caso, estariam
sujeitas à ação judicial implica manifesta desatenção ao texto
constitucional e aniquilação do poder de autotutela da administração,
com sério reflexo na autonomia administrativa do Poder Executivo”.
Coordenadoria de Editoria e Imprensa A notícia refere-seao seguinte processo: MS 15054
http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=102484
06/07/2011 |