Em cada análise realizada sobre o sistema tributário nacional, a
primeira informação - e talvez a que sempre chame mais a atenção - é que
diariamente entram em vigor centenas de novas leis tributárias
produzidas por todos os entes membros da federação. Essa já é uma
característica do sistema brasileiro, da qual decorre o ajuizamento de
grande número de demandas judiciais, preventivas ou repressivas,
encampadas por contribuintes insurgentes contra inconstitucionalidades
ou outros vícios, comumente praticados na produção legislativa.
Das contendas entre Fisco e contribuinte resultará a resposta do
Judiciário, que na missão para harmonizar as disposições legais com o
sistema constitucional tributário, determinará se as novas leis são com
ele compatíveis. Nesse sentido, as consideráveis e constantes alterações
no regime de compensação tributária são exemplo de assunto
recorrentemente analisado pelo Judiciário.
Com a criação da Super-Receita pela Lei nº 11.457, de 2007, que
unificou a administração da arrecadação da Receita Federal e do INSS,
por força de dispositivo contido naquele diploma legal, passou-se a
sustentar a possibilidade de compensação entre quaisquer tributos
administrados pela nova Secretaria da Receita Federal do Brasil. Essa
interpretação deu origem a novo conflito, levado ao Judiciário com o
Fisco defendendo a impossibilidade de compensação irrestrita entre
espécies tributárias, em oposição à alegação de possibilidade de
compensação entre quaisquer tributos administrados pela autarquia.
Do embate, recentemente circulou notícia de decisão do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) declarando a impossibilidade de contribuinte
compensar créditos de PIS e Cofins com débitos de contribuições
previdenciárias. Nesse caso, muito embora Fisco e contribuinte possuam
bons fundamentos em defesa de seus interesses, a controvérsia, nos
parece, deverá ser resolvida com sua análise à luz do sistema
constitucional tributário.
A compensação deve ser feita apenas entre contribuições da mesma espécie
Apesar da ainda existente divergência sobre esse ponto, a
Constituição Federal, como reconhece o Supremo Tribunal Federal (STF),
repartiu o tributos em cinco espécies: impostos, contribuições de
melhoria, contribuições, empréstimos compulsórios e taxas. A principal
característica da maioria dessas espécies é prévia vinculação de sua
receita ao custeio de alguma atividade estatal, o que, contudo, é vedado
ao resultado da arrecadação dos impostos. Assim, a arrecadação dos
impostos não poderá ter prévia destinação orçamentária definida, ao
contrário da arrecadação de contribuições, que o deverá ter, sob pena de
inconstitucionalidade.
Diante disso, cabe-nos questionar se a compensação irrestrita entre
tributos arrecadados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil não
fere o próprio regime constitucional diferenciado traçado para
contribuições e impostos. Se a Constituição Federal, então, determinou a
destinação do produto da arrecadação de alguns tributos, à lei
infraconstitucional não será lícito desfazê-lo, ainda que garantido o
exercício do direito do contribuinte à compensação.
Isso aconteceria com a indiscriminada possibilidade de compensação
entre tributos, já que, por exemplo, o orçamento da seguridade social
poderia restar prejudicado para saldar compensações de imposto federal
declarado inconstitucional em controle concentrado, quando contribuintes
poderiam buscar sua compensação.
Mais um passo: será que essa compensação deveria se dar somente entre
contribuições que atendam a mesma finalidade? Imaginamos que sim. Ao
impor regime especial ao sistema de seguridade social, a Constituição
Federal acaba por impor novo limite à compensação tributária, que deverá
ser realizada somente entre contribuições destinadas a esse fim.
Entendemos ser esse o limite imposto às compensações pela Constituição,
com o que, de certo modo, se coadunava o antigo regime de compensações,
veiculado pelo artigo 66 da Lei nº 8.383, de 1991, de legalidade
endossada pelo STJ.
Não obstante possa parecer que as restrições acima sejam muitas,
dentre os grandes grupos de tributos federais, PIS, Cofins, CSLL e
contribuições previdenciárias são contribuições de mesma espécie, qual
seja, contribuições sociais para custeio da seguridade social, o que
autorizaria a compensação entre elas. Ao passo que os impostos sobre a
renda, importação, exportação, industrialização de produtos, operações
financeiras e propriedade rural, como impostos federais, deveriam ser
amplamente compensáveis entre si.
Essa é nossa leitura sobre a permissão constitucional para
compensação tributária, dentro dos limites da qual o legislativo federal
deverá andar para sua regulamentação e o Judiciário analisar pedidos
tanto de contribuintes, quanto fiscais.
Thiago Taborda Simões e Guilherme P. Araujo
01/07/2011
Thiago Taborda Simões e Guilherme Peloso Araujo são sócios do Simões Caseiro Advogados.
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04/07/2011 |