Depois de lutarem contra o Código de Defesa do Consumidor (CDC), os
bancos tentam agora reverter entendimento do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) e fazer com que a legislação seja aplicada em discussões
sobre lançamentos em contas correntes. A 2ª Seção julga, por meio de
recurso repetitivo, se o prazo de 90 dias para reclamar de vícios
aparentes ou de fácil constatação, previsto no artigo 26 do CDC, vale
para as ações de prestação de contas ajuizadas por clientes. Por ora, as
instituições financeiras perdem por um placar de dois votos a um.
O caso, que envolve um cliente do Banco do Brasil, começou a ser
analisado em abril. Preliminarmente, os ministros decidiram admitir a
Federação Brasileira de Bancos (Febraban) como amicus curiae - amigo da
Corte - e julgar o processo como repetitivo. No mérito, após o voto da
relatora, ministra Maria Isabel Gallotti, contrário à aplicação do CDC,
pediu vistas a ministra Nancy Andrighi.
O julgamento foi retomado em maio. Após o voto-vista da ministra
Nancy Andrighi, que seguiu o entendimento da relatora, a seção analisou
novamente se deveria ser mesmo dado status de recurso repetitivo ao
caso. Por maioria, manteve-se a decisão anterior. Após a discussão, o
ministro João Otávio de Noronha apresentou seu voto, favorável à tese
dos bancos.
Na análise de outros casos, a ministra Nancy Andrighi, por exemplo,
já havia proferido voto pela não aplicação do código. Para ela, a
discussão não envolve a má-prestação de serviço, mas a devolução de
taxas e tarifas bancárias consideradas indevidas. Com isso, segundo a
ministra, seria impossível enquadrar o pedido de repetição do indébito
nas hipóteses previstas no CDC. "Repetir o pagamento indevido não
equivale, nem pode ser equiparado, à reexecução, à redibição e ao
abatimento do preço, porque, na verdade, não se trata de má-prestação do
serviço, mas de flagrante e inequívoco enriquecimento sem causa do
recorrido (banco), que cobrou por serviço jamais prestado", diz em voto
proferido recentemente.
Sem a aplicação do CDC, vale o prazo previsto no Código Civil - dez
anos (novo) ou 20 anos (antigo) -, segundo o advogado Julio César
Dalmolin, do escritório Gund, Wiebelling & Dalmolin Advogados
Associados, que defende o correntista na ação ajuizada contra o Banco do
Brasil. "Não é um vício aparente, mas uma cobrança indevida", afirma o
advogado.
Apesar do entendimento majoritário do STJ ser contrário à aplicação
do artigo 26 do CDC, advogados que defendem instituições financeiras
ainda alimentam esperanças de vitória. "A discussão não vai ser tão
fácil como parece", diz o advogado Aitan Portela, do Aidar SBZ
Advogados, acrescentando que os pedidos de vista mostram que os
ministros estão refletindo mais sobre o tema. "O prazo deve ser de 90
dias. Já foi definido que a relação entre cliente e banco é de consumo."
Em 2006, o Supremo Tribunal Federal (STF) conclui, de forma unânime,
que as instituições financeiras devem se submeter às regras do CDC.
Desde então, os bancos defendem a aplicação do artigo 26. No STJ, eles
já haviam sido derrotados em uma questão preliminar. Os ministros
firmaram entendimento que, independentemente do envio regular de
demonstrativos e extratos bancários, o correntista tem direito a propor
uma ação de prestação de contas. Uma súmula nesse sentido foi aprovada
pela 2ª Seção em 2001.
A diretoria jurídica da Febraban acompanha com preocupação o
julgamento na 2ª Seção. Para a entidade, a não aplicação do CDC gera um
sério problema para os bancos, que são obrigados a analisar lançamentos
feitos por anos em apenas cinco dias. Esse é o prazo para contestação de
ações de prestação de contas previsto no Código de Processo Civil
(artigo 915). "Os clientes ajuizam as ações e pedem esclarecimentos
sobre os lançamentos feitos nas contas correntes nos últimos cinco, dez
ou até 20 anos. Os bancos não conseguem levantar essas informações no
prazo de cinco dias", diz em nota a diretoria jurídica da entidade.
Arthur Rosa | De São Paulo
16/06/2011
http://www.valoronline.com.br/impresso/legislacao-tributos/106/442743/bancos-pedem-aplicacao-do-cdc
16/06/2011 |