Na hora de encerrar suas atividades no Brasil, algumas multinacionais
enfrentam uma verdadeira via crucis. Isso porque são obrigadas a
enfrentar exigências burocráticas impostas pelos Fiscos para concluírem o
processo. E só conseguem se livrar dos empecilhos desses órgãos por
meio do Poder Judiciário. Uma recente decisão judicial, por exemplo,
assegurou a uma empresa estrangeira no Brasil o direito de encerrar suas
atividades, mesmo sem ter passado o período de cinco anos que a Receita
Federal tem para fiscalizar compensações tributárias.
Na decisão, a juíza Vera Cecília de Arantes Fernandes Costa, da 2ª
Vara de Araraquara da Seção Judiciária do Estado de São Paulo,
determinou à Receita Federal que, no prazo de 120 dias, finalize os
processos com os pedidos de compensação apresentados pela multinacional
nos últimos cinco anos de atividade.
Formalizado o pedido de compensação de débito tributário, ele é
homologado tacitamente e o crédito é extinto definitivamente quando a
compensação não é negada no prazo de cinco anos, de acordo com a Lei nº
9.430, de 1996. No caso, porém, a multinacional norte-americana queria
encerrar as atividades no Brasil, antes de transcorrido esse período.
Apesar de estar em situação regular perante a Receita, a empresa não
conseguia dar baixa no CNPJ. O motivo era esse prazo de cinco anos ainda
não ter terminado. "Realmente não é razoável exigir do contribuinte que
ele fique à mercê do Fisco", afirmou a magistrada na decisão.
Segundo o advogado que representou a multinacional, Fábio Rosas, do
escritório TozziniFreire Advogados, os principais argumentos usados no
processo foram a violação aos princípios da livre iniciativa, da
razoabilidade e da eficiência da administração pública. Todos foram
acolhidos. "A sentença abre um importante precedente, impedindo que as
empresas fiquem nas mãos da autoridade administrativa indefinidamente, o
que gera custos para elas", afirma. O advogado explica que cabe recurso
contra a sentença, mas provavelmente não terá eficácia porque a
companhia já terá sido encerrada.
A advogada Gabriela Lemos, do escritório Mattos Filho Advogados,
lembra que uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pode reforçar
esses argumentos. Ao julgar uma ação direta de inconstitucionalidade
(Adin), os ministros decidiram ser inconstitucional a exigência de
certidão negativa de débitos fiscais como condição para, por exemplo,
alterar o registro na Junta Comercial.
A dificuldade para fechar as portas no Brasil é tão grande que uma
multinacional do setor de informática iniciou seu processo de
encerramento em 2002 e até hoje não conseguiu concluí-lo. No caso, a
companhia resolveu discutir a legalidade da cobrança de um suposto
débito fiscal na Justiça. Considerando a demora e o cenário econômico
atual do país, a empresa resolveu ficar no Brasil. A Receita Federal e a
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) foram procuradas pelo Valor, mas não quiseram comentar o assunto.
Especialistas chamam esse tipo de situação de sanção política do
Fisco. São as exigências feitas pelos órgãos de fiscalização para
obrigar o contribuinte a pagar os impostos que, supostamente, deve.
Assim como no encerramento da atividade, nas incorporações as empresas
também sofrem com a burocracia fiscal brasileira. Há decisões judiciais
da Justiça Federal que liberam as incorporadas de apresentar certidão
negativa de débitos à Junta Comercial para registro da operação. A
incorporada também precisa dar baixa no CNPJ junto à Receita Federal. É
nesse sentido a liminar da 14ª Vara Federal do Rio de Janeiro, por
exemplo. A decisão é do juiz Adriano Saldanha Gomes de Oliveira.
"Trata-se de sanção política porque a Receita tem outros meios, como a
execução fiscal, para cobrar tributos", diz o advogado Marcos André
Vinhas Catão, do Vinhas e Redenschi Advogados.
Laura Ignacio | De São Paulo
04/11/2010
http://www.valoronline.com.br/impresso/legislacao-tributos/106/331923/empresas-vao-a-justica-para-encerrar-atividades-no-pais
04/11/2010 |