A enxurrada de recursos externos para
a Bovespa pode estar com os dias contados. A valorização da bolsa neste ano foi
em grande parte patrocinada pela entrada do capital estrangeiro. Para se ter
ideia, no ano, até dia 15 deste mês, o saldo líquido (compras menos vendas) de
investimento internacional na Bovespa estava positivo em R$ 22,150 bilhões. De
longe, é o melhor saldo desde 1994, quando foi permitida a entrada desse público
por meio do velho Anexo IV. Esse nível de entrada de dinheiro e,
consequentemente, de alta da bolsa, pode estar comprometido dada a decisão do
governo, anunciada na noite de ontem, de colocar o Imposto sobre Operações
Financeiras (IOF) de 2% sobre as aplicações de capital estrangeiro tanto em
renda fixa quanto em variável.
A notícia foi divulgada quando o
pregão já havia terminado, portanto, não influenciou no fechamento do Índice
Bovespa, em alta de 1,57%, aos 67.239 pontos. No entanto, teve impacto no pregão
noturno (o chamado "after market"), que chegou a estar no seu limite de queda,
de 2%. É razoável imaginar que o Ibovespa começará o pregão de hoje em baixa,
possivelmente até dos 2% registrados no "after market", acredita o economista da
corretora Ágora, Álvaro Bandeira.
A medida passa a vigorar a partir de
hoje e, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, o objetivo é evitar um
excesso de especulação na bolsa em razão da grande liquidez que existe hoje. Na
visão dos profissionais de mercado, o governo mirou no que viu e acertou no que
não viu. Colocando o IOF de 2% de forma indiscriminada, o governo acaba inibindo
a entrada tanto do capital especulativo de curto prazo quanto do de longo
prazo.
"Se queria impedir a entrada do
investidor com perfil mais especulativo, o governo deveria colocar um IOF
regressivo que incidisse somente na saída do dinheiro do país e não na entrada
como será feito", diz o sócio da Leblon Equities, Pedro
Rudge. Ele acredita que o dinheiro que entrou na bolsa este ano é
predominantemente de longo prazo, portanto, não deveria ser prejudicado.
Contraproposta
Ao saber da medida, a direção da bolsa
não ficou de braços cruzados. O diretor-presidente da
BM&FBovespa, Edemir Pinto, conversou por telefone com o
ministro Mantega sugerindo o envio de uma contraproposta à medida. Ela ainda
será elaborada, mas deve ir na linha exatamente do IOF regressivo, punindo o
capital de mais curto prazo. "O ministro se mostrou bastante receptivo a nos
ouvir", diz Pinto. Ele afirma que a medida como está deve inibir a entrada de
novos recursos internacionais no país, o que diminui o volume diário de negócios
na bolsa que, atualmente, é um terço formado por estrangeiros. "Isso pode
impactar a rentabilidade da bolsa como empresa", diz o diretor-presidente. Não é
à toa que as ações ordinárias (ON, com voto) da BM&FBovespa fecharam os
negócios do "after market" em queda de 3,48%, aos R$ 13,28.
Pinto acredita que a cobrança de IOF
deve transferir os negócios para o mercado americano, para os American
Depositary Receipts (ADRs, recibos de ações negociados nos EUA) das empresas
brasileiras. Além disso, pode prejudicar a nova onda de ofertas públicas de
ações, já que, em média, 70% desses papéis ficam nas mãos do público
internacional. Ele afirma ainda que o dinheiro que está entrando no mercado vem
atrás dos bons fundamentos da economia brasileira divulgados frequentemente pelo
próprio Mantega.
Em 2002, depois de um forte pleito da
Bovespa, o governo retirou a Contribuição Provisória sobre Movimentações
Financeiras (CPMF) para investimentos estrangeiros em bolsa. Naquela época, uma
boa parte dos negócios do pregão da Bovespa havia migrado para Nova York, para
negociar as ações brasileiras sem o imposto.