Atualmente, diversos serviços e facilidades
são colocados à disposição dos consumidores pelas empresas de
telecomunicações: jogos, vídeos, voz, música, mensagens de texto – quase
tudo pode estar acoplado a um telefone celular. Os avanços tecnológicos
surgem a cada dia, mas nem sempre a legislação segue o mesmo ritmo, e
os tribunais têm de se manifestar a respeito de muitas demandas. Entre
esses temas, estão os serviços de valor adicionado.
Os serviços
de valor adicionado prestados pelas empresas de telefonia e informática
são novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento,
apresentação, movimentação ou recuperação da informação. Sua previsão
está no artigo 61 da
Lei Geral de Telecomunicações
(Lei 9.472/97) e a discussão principal no STJ está em saber quando
executam ou não serviços de telecomunicação, passíveis da incidência de
ICMS, ou quando compõem uma relação de serviços tributáveis.
Um
desses debates ocorreu em maio de 2005, quando, após sucessivos pedidos
de vista, a Primeira Turma decidiu que não caberia ICMS sobre as
receitas decorrentes exclusivamente da prestação de serviço de acesso à
internet. Em dezembro de 2006, foi editada a Súmula 334, fixando
jurisprudência com o enunciado de que “o ICMS não incide no serviço dos
provedores de Internet” (EREsp 456.650).
Polêmica tributáriaO
provedor de internet exerce dois papeis fundamentais: alimenta a rede
com informações e permite a conexão do usuário à rede. O serviço de
provimento de acesso à internet consiste na realização do processo de
autenticação, com o fornecimento de endereço IP aos usuários. No último
caso é que residia a polêmica tributária, como informou à época do
julgamento do recurso, em seu voto, a ministra Eliana Calmon.
Segundo
a ministra, a Constituição Federal de 1988, determinou que, sobre a
prestação de serviços de comunicação, incida o ICMS. A dúvida estava em
saber se o serviço de acesso à internet seria ou não serviço de
telecomunicação. A regra matriz do ICMS sobre serviços de
telecomunicação, segundo entendimento da Primeira Seção, é prestar
serviço de comunicação, e não realizar comunicação, de modo que seria
ilegal a incidência do imposto.
Antes do julgamento desse
recurso, em divergência com a Segunda Turma, a Primeira Turma do STJ
tinha decisão no sentido de que os provedores de acesso deveriam estar
sujeitos ao ICMS.
Em meados de 2001, no julgamento do REsp
323.358/PR, a Segunda Turma tinha entendido que a relação existente
entre o provedor de acesso e o usuário possui natureza negocial, na
medida em que visava a possibilitar a comunicação desejada pelo usuário,
sendo passível a incidência do imposto.
Em voto proferido na
Primeira Seção, no entanto, o ministro Franciulli Netto esclareceu que o
serviço prestado pelo provedor de acesso à internet não se caracteriza
como serviço de telecomunicação, porque não necessita de autorização,
permissão ou concessão da União (art. 21, XI, da Constituição Federal).
Tampouco oferece prestações onerosas de serviços de comunicação, conforme o artigo 26, III, da
Lei Complementar 87/96,
porque não fornece as condições e meios para que a comunicação ocorra,
sendo um simples usuário dos serviços prestados pelas empresas de
telecomunicações.
Serviços suplementaresEm
julgamento acerca da incidência do ICMS sobre serviços de valor
adicionado, o ministro Humberto Gomes de Barros destacou, no julgamento
do REsp 402.047, que não incide o imposto sobre os valores cobrados a
título de acesso, adesão, ativação, habilitação, disponibilidade,
assinatura e utilização de serviços, bem como aqueles relativos a
serviços suplementares e facilidades adicionais que otimizem o processo
de comunicação.
O ministro fundamentou a decisão no princípio da
tipicidade do Direito Tributário, segundo o qual a interpretação deve
ser feita de forma estrita, tanto para a concessão de benefícios
fiscais, quanto para a exigência de tributos, não sendo lícito alargar a
base de cálculo de ICMS incidente sobre serviços de comunicação.
O
ministro Teori Albino Zavascki também assim decidiu no julgamento de um
recurso em que o Estado do Rio Grande do Sul reclamava a incidência do
imposto. A incidência sobre a atividade de habilitação de telefone
celular, segundo ele, não se enquadrava no conceito de telecomunicação
do art. 2º, III, da LC 87/96, sendo ilegítima a inserção dos valores
pagos na base de cálculo do imposto, como fez o convênio ICMS 69/98
(REsp 769.569).
Os serviços acessórios ou suplementares ao
serviço de comunicação envolvem locação de aparelhos, manutenção das
estações rádio-base, das torres de transmissão, dos softwares de
gerenciamento e outros (REsp 760.230).
Incidência de ISSO
Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) é um imposto
municipal e tem como fato gerador atualmente a lista de serviços da
Lei Complementar 116/2003.
Fixado
o entendimento de que a atividade desempenhada pelos provedores de
acesso constitui serviço de valor adicionado, segundo a ministra Eliana
Calmon, as Turmas de direito público do STJ passaram a decidir pela não
incidência do ISS, em razão da atividade não estar compreendida na lista
anexa ao
Decreto-lei 406/68 (REsp 1.183.611).
A
lista de serviços anexa ao referido decreto-lei possui um rol taxativo e
exaustivo, segundo a ministra, de modo que é possível apenas uma
interpretação extensiva dos itens nela contidos, para o enquadramento de
serviços idênticos aos ali expressamente previstos, mas com
nomenclatura diversa.
Os provedores exercem atividade sujeita ao
ISS, desde que tenha lei complementar que os coloquem na lista de
serviços. Em um caso analisado pela Primeira Turma, o Município de Belo
Horizonte pretendia a inclusão dos provedores nos itens 22, (vetado),
24, 40, 50 e 74 do Decreto-lei 406 (REsp 658.626).
O item 24
prevê, em síntese, a incidência de ISS sobre os serviços de "análises,
inclusive de sistemas, exames, pesquisas e informações, coleta e
processamento de dados de qualquer natureza". O item 40 dispõe que a
exação relaciona-se aos serviços de "ensino, instrução, treinamento,
avaliação de conhecimentos, de qualquer grau ou natureza".
O
item 50, por sua vez, estabelece a relação com serviços de
"agenciamento, corretagem ou intermediação de bens móveis e imóveis não
abrangidos nos itens 45, 46, 47 e 48"; e o item 74 menciona serviços de
"instalação e montagem de aparelhos, máquinas e equipamentos, prestados
ao usuário final do serviço, exclusivamente com material por ele
fornecido".
A ministra Denise Arruda concluiu que não havia
nenhuma identidade entre o serviço prestado pelo provedor e os itens
mencionados pelo município. De acordo com a relatora, os provedores
apenas possibilitam o acesso dos usuários às informações constantes da
internet. Assim, eles apenas as recebem da rede e as retransmitem ao
usuário conectado.
Posição do STFPor
sete votos a dois, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF)
confirmou, no último dia 6 de fevereiro, acórdão do STJ segundo o qual a
habilitação de aparelhos para o uso do serviço de telefonia móvel
celular não está sujeita a incidência do ICMS. A decisão foi tomada no
julgamento do Recurso Extraordinário 572.020.
O STJ já havia
decidido no julgamento do REsp 1.176.753, no final de 2012, que não
incide o imposto sobre esse tipo de serviço. De acordo com a posição
vencedora no julgamento, os serviços acessórios não interferem na
comunicação, por isso não há incidência de ICMS.
O ministro
Mauro Campbell, que ficou responsável pela redação do acórdão, afirmou
que a incidência do ICMS, no que se refere à prestação dos serviços de
comunicação, deve ser extraída da Constituição Federal e da Lei
Complementar 87/96.
Para Campbell, o tributo incide sobre os
serviços de telecomunicação prestados de forma onerosa, através de
qualquer meio, inclusive a geração, emissão, recepção, transmissão,
retransmissão, repetição e ampliação de comunicação de qualquer natureza
(artigo 2º, III, da LC 87).
“A prestação de serviços conexos ao
de comunicação por meio da telefonia móvel (que são preparatórios,
acessórios ou intermediários da comunicação) não se confunde com a
prestação da atividade fim – processo de transmissão (emissão ou
recepção) de informações de qualquer natureza –, esta sim passível de
incidência do ICMS”, afirmou o ministro.
Serviços de comunicação“A
despeito de alguns deles serem essenciais à efetiva prestação do
serviço de comunicação e admitirem a cobrança de tarifa pela prestadora
do serviço (concessionária de serviço público), por assumirem o caráter
de atividade meio, não constituem, efetivamente, serviços de
comunicação, razão pela qual não é possível a incidência do ICMS”,
acrescentou Mauro Campbell.
Ficou vencido no julgamento o
relator do recurso, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, que entendeu que
a tributação deveria incidir sobre todos os serviços, inclusive os
preparatórios, uma vez que possibilitam a oferta de telecomunicação,
conceituada no artigo 60 da Lei 9.472/97.
Segundo esse artigo,
“serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a
oferta de telecomunicação”, sendo esta definida como “transmissão,
emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou
qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres,
sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza”.
“O
que se tributa é a prestação onerosa de serviços de telecomunicação,
que compreende, obviamente, o serviço remunerado que propicia a troca de
mensagens/informações entre um emissor e um receptor, e também uma
série de outras atividades correlatas”, afirmou o relator.
Essas
outras atividades, continuou ele, “embora possam ser consideradas
preparatórias ou acessórias, são indispensáveis para que a comunicação
se efetive na prática, caracterizando, portanto, o conjunto dessas
atividades, o serviço de comunicação sobre o qual, na ótica legal e
constitucional, deve incidir o tributo em questão”.
Apreciando a
questão relativa à legitimidade da cobrança do ICMS sobre o
procedimento da habilitação de telefonia móvel, ambas as turmas de
direito público do STJ tem entendimento de que a descrição de serviço de
telecomunicação constante do artigo 2º, III, da Lei Complementar 87/96,
é procedimento meramente protocolar, cuja finalidade prende-se ao
aspecto preparatório e estrutural da prestação do serviço (REsp
760.230).